sábado, 5 de outubro de 2013

Câncer - A dúvida fazer ou não quimioterapia?

Compreender o mal não o cura, mas, sem dúvida alguma, ajuda. Afinal, é muito mais fácil lidar com uma dificuldade compreensível que com uma escuridão incompreensível - Carl Jung.
Você já se encontrou num trampolim, com medo de saltar, estando atrás de você uma inexorável fila de pessoas determinando a irreversibilidade de sua situação? Você acaso já conheceu o pânico dos momentos em que gostaria de voltar atrás, mas não pôde.
Já experimentou uma leve cãibra por todo o corpo nos instantes em que se vê de encontro marcado com o desconhecido?
Quanto mais conscientes nos tornamos da necessidade de pular do trampolim, e quanto mais vontade temos de implorar à fila que nos pressiona que nos deixe descer, maior é o esgarçamento de nosso coração e a certeza de que não temos saída.
A primeira coisa que percebemos é que, em momentos sem saída, instaura-se um intenso diálogo interno.
Tememos, portanto, o conhecido, e só conseguimos imaginar nosso futuro em termos de nosso passado. Ficamos incapacitados de imaginar o que pode ser a liberdade, só conseguimos conceber o retorno à escravidão. Trocaríamos assim, sem qualquer hesitação, o desconhecido pelo conhecido, mesmo que ruim e doloroso.
 Não queremos ver que há saída.
A sensação de não haver saída é produto da não aceitação de nossa condição. Esta relutância em aceitar a situação em que se está é um mimo natural vivenciado por qualquer ser vivo, pelo fato de a ordem do Amor nos aquecer, alimentar, iluminar e dar prazer. Diante da possibilidade de algo ruim, querer o bom é bastante natural; o único problema é que esta não é a realidade.
Não há opção, há o que é.
A aceitação disto é fundamental para se perceber que existe, sim, saída. Não haver saída é sinônimo de não aceitação.
Queremos algo bom e nos são apresentadas apenas opções de algo ruim.
É como se estivéssemos estabelecendo que "não haver saída" é a experiência imaginária em que gostaríamos de estar em outro "aqui e agora", que torna insuportavelmente pesado o compromisso com o nosso verdadeiro "aqui e agora". O segredo é: “Fica” Fica aqui, põe os pés no lugar onde realmente estás e haverá saída.
A saída não está em voltar à margem para contemplar a onda, mas na interação "gelada" com a onda.
O próprio intelecto reconhece nossa fraqueza e, enquanto tenta honrar nosso discernimento sobre a existência de uma possível saída, sentimos e sofremos pela truculência do sentimento de não haver saída.
Então, qual é a saída que existe quando "não há saída"? Esta é a sua fala e esta a sua obrigação.
Mas não queira dar a solução, não queira resolver algo de forma objetiva e concreta sem retornar ao nível do concreto e objetivo.
Descobrimos assim que a capacidade de entrega é o único caminho para que se abram os mares diante das posições encurraladas de nossas vidas. E a entrega não é um dom natural de um indivíduo.
A entrega não é resultante de um inconsciente animal que se impõe sobre a consciência, mas da interação complexa entre o nosso ser que experimenta as sensações (medo, dor, alegria), nosso ser que dá sentido e significado a estas experiências e nosso ser que regula o compromisso entre o significado e a experiência.
Este último, denominado alma, é o elemento de suprema sutileza da existência humana, que orquestra as impossibilidades ou as saídas de onde "não há saída". Qualquer dificuldade de comunicação entre estes elementos resulta em desespero.
Manter estes canais de comunicação funcionais e eficazes é um esforço que faz a diferença — abre mares que nunca antes se imaginou pudessem ser abertos e dá opções ao que até então estava encurralado.
Trata-se, na verdade, de uma experiência análoga à de pessoas com doenças muito graves, como o câncer. O tratamento destas doenças poderia ser considerado como o avanço gradativo ao nosso fim.
Sabemos que se permanecermos ingerindo os potentes e tóxicos remédios de que hoje dispomos para lidar com a doença estamos lentamente caminhando para a deterioração de nossos corpos, culminando em morte.
Se, no entanto, recusarmos a utilizar estes, que são os únicos medicamentos disponíveis, realizaremos, em certa medida, um suicídio. Novamente, o nosso drama está na ausência de certezas. Se os remédios não pudessem curar, de imediato seriam abandonados.
Porém, uma mínima porcentagem responde ao tratamento, e isto já é o suficiente para tornar a outra opção uma forma de suicídio?
Qual seria, então, a saída?  Devemos lembrar que a saída de uma situação que não tem saída não é da mesma ordem que as "saídas" ordinárias do dia-a-dia.
Nestas últimas, fazemos apenas um remanejamento de nossos recursos e poderes. Nas saídas onde não há saídas não dispomos dos recursos que desejamos para negociar nossos arbítrios.
Entretanto, dispomos da possibilidade de arbítrio.
Não podemos estar alegremente e despreocupadamente observado a beleza do azul da piscina lá embaixo, mas podemos permanecer ou ir de encontro a ela, pulando do trampolim. Não podemos estar fora da  quimioterapia, mas podemos nos manter nela ou enfrentar as consequências. Nesta escolha que, reconhecemos, deixa pouca margem, reside a vida. Sem ela estamos, por definição, mortos. Será?
A margem pode ser muito pequena, mas sua intensidade é exponencial. E, é claro, esta não é uma questão teórica e em algum momento teremos de nos decidir.
Quando sua decisão for tomada, quando já não mais houver alternativas envolvidas e for chegado o momento de proceder à escolha, de se entregar ao próprio destino... Ainda assim haverá escolha.
Na verdade, esta é a escolha que liberta ou desespera.
Sempre teremos a derradeira possibilidade de aceitar ou não aceitar o que nos acontece. O "temor aos céus" é a esperança de que haja um quinhão no mundo da Verdade que seja nosso, que nos diga respeito.
Por mais dolorosa que seja uma experiência, a aceitação reflete a percepção de que há um processo e de que não estamos sendo excluídos do mesmo.
"Ficar" — estar no lugar e no momento — é o passo inicial para "marchar". Ao marcharmos e darmos curso a um projeto ou a um processo, por incrível que possa nos parecer, se faz possíveis coisas que fora deste processo seriam uma impossibilidade.
Não se trata de um milagre e também não é a realização de nossas expectativas ou daquilo que gostaríamos que acontecesse, mas é o resultante de um processo maior do que simplesmente o nosso desejo.


Mesmo quando estamos na mais absoluta impotência, atirados sobre uma cama e submetidos a um balão de oxigênio, sempre podemos ser mestres do nosso momento, que estejamos aparentemente sem opções e poderes para barganharmos com a vida. 
Maria de Fátima Jacinto do Blog  http://araretamaumamulher.blogspot.com.br

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